Eu não gosto de estrangeirismo. É impressionante o quanto de palavras estrangeiras importadas se alastram pelo território vocálico brasileiro. Isso me causa antipatia.
Dia desses deparei-me com um tal de “bombshell” em uma postagem de fofoca sobre celebridades. Bombshell… É claro que pensei em bomba de gasolina da Shell. Nos comentários – o local mais interessante das redes sociais – várias pessoas se perguntavam o que significava tal palavra, uma arriscou com um “será que fulana é uma bomba?”. Como tudo na internet é veloz, logo apareceu uma alma gentil que explicou que “era uma gíria antiga utilizada nos cinemas americanos dos anos 1950, para dizer que uma loira é “bombástica”. Por que não valorizar a beleza com o emprego simples de “loiraça” ou mesmo “louraça”? Abarca beleza e proporciona grandiosidade.
A língua portuguesa é uma das mais belas do mundo e abundante em vocábulos com seus muitos sinônimos. Nada justifica o uso de palavras estrangeiras jogadas em meio as portuguesas como se joga dados. A sorte é aleatória. As palavras nos revelam.
Ao assistir um vídeo no YouTube, um influenciador inseria uma palavra estrangeira a cada quatro portuguesas. Era um tal de “mindset” para lá, “call” para cá e até um tal de “job”. Em algum momento, alguém enviou um comentário com uma citação inglesa, de tamanho razoável, para que ele comentasse a respeito, julgando que o mesmo conhecia e falava inglês. Mas não. O influenciador ficou sério e ao olhar acanhado para a câmera confessou que não sabia inglês.
Nos bons tempos como radialista, em especial como locutora de FM, várias eram as músicas executadas em inglês. Lembro que, no início, tinha muita dificuldade com a pronúncia e os locutores mais antigos sempre me lembravam: “Se não sabe ou não tem segurança quanto a pronúncia, é melhor não falar, senão ficará feio”. Segui com certa desconfiança até desenvolver a pronúncia básica. Com precaução sempre; medo, jamais.
O uso do estrangeirismo não garante fluência na língua estrangeira. Vocábulos soltos não constroem frases. No fim, é um desrespeito com ambas. E ainda nesse fim: não se fala nem uma, nem outra e tampouco uma terceira (dialeto). A comunicação torna-se fria e as pessoas dispersam-se com rapidez.
Aprecio o regionalismo, atento-me as gírias, pois me permitem compreender outras culturas, conhecer um pouco o Brasil.
Em 2005 visitei Salvador, minha melhor viagem, agradável e rica. Assim que cheguei, minha amiga soteropolitana me perguntou “se eu comia água”. Prudentemente perguntei o significado, e ela: “como se diz na tua terra quando se quer beber muito?”. Sem titubear respondi: “Ah, encher a cara, chapar os cocos”. Ela não deixou evaporar: “Então, bora encher a cara, comer água?”. Aceitei.
Por dias, com o nosso grupo, perambulando por praias e tantos pontos turísticos, compreendi e dei razão ao uso corriqueiro da expressão: os baianos não bebem, comem com disposição e fartura. Ingerem doses volumosas. Faz todo sentido. Povo forte até na bebida. Um brinde aos conterrâneos de Caetano Veloso, que faço das palavras dele um pouco as minhas “que povo lindo!”.
Se a bombshell eleva uma beldade, o mesmo não se pode dizer do emprego de “mulherzinha”. Quando estive em Natal vi o quanto essa palavra é usada facilmente. Por lá, tudo bem. Porém, quando soube que uma nativa iria, em pouco tempo, passar alguns dias no Espírito Santo, achei melhor advertir: “Olha, quando chegar lá não use mulherzinha, pois literalmente é diminuir, menosprezar uma mulher e, ao contrário daqui, vai gerar confusão”.
E por falar no Espírito Santo há duas palavras que empregamos com naturalidade, em especial, a segunda: cacunda e gastura. A primeira se refere aos “ombros, costas”, desconfio que seja uma variação de “corcunda”. Já gastura é o mesmo que agonia. Compreensível se considerar o que algo gasto, algo que foi muito utilizado pode nos provocar.
Essas gírias, entre tantas outras, despertam um olhar compassivo sobre como o brasileiro, em diferentes estados e regiões, compreende o seu entorno. Isso não o empobrece. O uso estranho e compulsivo do estrangeirismo, sim.
A língua portuguesa, nossa bela herança lusa, é rica, viva e reciclável. Filha predileta do latim, é poética em si. Por fim, e sem cessar, a beleza das palavras encontra-se no seu correto emprego em um contexto. Bombástico.
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